"Cirurgião" de relógios dá vida a antiguidades
Existem quartos, salas e uma 'oficina' decorados com o seu património de relógios que compassam o ritmo do apaixonado coração de Fernando Lopes pela arte da minúcia e pela engenharia da precisão, mas o próprio admite que lhe vai faltar tempo para tamanha tarefa.
Aos 68 anos, diz que lhe bastam os dedos de uma mão para contar os mecânicos de relojoaria que ainda sobrevivem em Portugal, mas não consegue calcular a fortuna que representa este mercado potencial de fãs e colecionadores feito de magnatas e políticos, de homens do petróleo a jogadores de futebol.
"Há cada vez menos pessoas a comprar, mas em contrapartida temos outras que são capazes de dar 10, 20, 30 mil euros por relógios", sublinhou Fernando Lopes, revelando que "na Marinha Grande há quem tenha uma coleção que vale milhões".
Teima em recusar o 'título' de relojoeiro. "Sou mecânico de relojoaria", com "o sonho de reparar um Grandfather Clock, um relógio inglês, especial, como o que existe na Assembleia da República, que é único em Portugal", assinalou.
O relógio ainda não deu entrada de 'urgência' no 'hospital' de Fernando Lopes, mas só em fresas para criar os dentes das rodas o mecânico de relojoaria já gastou 2.000 euros, assim como se tivesse cedido ao capricho de comprar esperança, reservando todo o material necessário para a 'cirurgia' com que sonha.
Encostado a um vibrograf, uma máquina capaz de fazer uma espécie de eletrocardiograma a um relógio e que custa cerca de 6.000 euros, o artificie da relojoaria alerta que há demasiadas razões que explicam por que razão esta é uma profissão em vias de extinção.
Rodeado de tornos, máquinas, ferramentas, de caixas onde 'habitam' ponteiros, suspensões, buchas, pêndulos, parafusos, argolas, cordas, cavilhas e brocas, Fernando Lopes garantiu que um 'kit' de qualidade razoável para um mecânico de relojoaria não custa menos do que 50 mil euros.
"Tem de se ser rico, possuir uma vista fabulosa e faculdades do foro neurológico e psicológico, porque a mão tem de ser firme para o trabalho", avisou.
Entre as suas mãos, que não tremem perante um relógio de 1825, que teve o seu tempo e lugar nas estações de caminho-de-ferro, ou peças francesas de 1870, que quase desapareceram durante a I Grande Guerra Mundial, reconstrói-se, como diz, "a História da relojoaria".
Já lá vai o ano de 1956, em que ganhava 10 escudos por dia e um relógio custava 500. Já se foi o tempo em que levava para casa 50 escudos por dia e resolveu investir 850 no primeiro torno de relojoaria.